Escritora, autora do livro Rabiscando os caminhos da prosa
v.m.j@hotmail.com
No balanço de uma rede,
Sempre desejo estar.
Mas com medo de uma queda
Deixo o desejo para lá…
Nada é mais preocupante para mim do que a ideia de ter que dormir em rede.
Dia desses, recebi um convite para assistir à posse de uma amiga em uma Academia, no interior do Ceará.
Por desconhecer a estrada e a cidade, recorri ao amigo Google, para melhor me situar. Diante das informações, decidi pernoitar evitando pegar a estrada à noite.
Já estávamos, eu e o meu esposo, mais ou menos resolvidos, quando a nossa amiga ofereceu estadia na casa da sobrinha dela. Educadamente agradecemos e dispensamos a oferta.
Contudo, ela insistiu tão carinhosamente, que sequer ficou brecha para recusas. Aceitamos.
Contudo, ela insistiu tão carinhosamente, que sequer ficou brecha para recusas. Aceitamos.
A partir daí, começou o meu aperreio, pois tenho o péssimo hábito de sofrer com antecedência, pensando nos prós e contras. Imaginei situações mil.
Sabendo que a família toda dela estaria presente à cerimônia – isso, incluindo os parentes que residem em outras cidades –, fiquei imaginando, como a anfitriã acomodaria tantos convidados. Haveria cama suficiente para todos? Sim, porque eu não durmo de rede, nunca dormi! E se a única opção fosse essa?
Angústia me definia naquele instante.
Desejosa de não mais sofrer, decidi que, se não houvesse jeito, arrumaria uma saída qualquer. A pousada “O Bastião”, resultante da pesquisa anterior, entrou no foco principal.
Não minto, fui dormir preocupada com o dia seguinte. A rede armada, com certeza, foi o último pensamento da noite. Não deu outra, sonhei com o meu esposo me ensinando como deitar numa rede. E era tanta fofoca que, de fato, no sonho quase caí da famigerada.
Acordei assustada me debatendo. Graças a Deus foi só um sonho! Ou um pesadelo, não sei… O coração dava mil pulos dentro do peito.
Definitivamente dormir de rede é um requisito nordestino que, por medo, nunca fiz questão de aprender. Até comprei algumas redes e tentei usufruir do balanço, mas só em pensar em quedas, resolvi guardá-las no fundo do baú – literalmente.
Na última mudança de residência, dei todas de presente.
Até já me sentei numa rede, armada a dez centímetros do chão. Porém, sinceramente, esse é um apetrecho que não me seduz. Aceito a compreensão daqueles que não vivem sem ela.
Mas voltando ao assunto primeiro. Chegamos à casa da nossa anfitriã, onde fomos muito bem recebidos. Na verdade, uma festa nos aguardava. Mal colocamos as malas no chão, já fomos arrastados para a grande copa. A mesa já estava posta, com bolos, pães, tapiocas e o famoso cafezinho. Nessa tarde, além de um bom papo, tínhamos, ao vivo e a cores, nada mais nada menos do que a presença do nosso grande poeta Antônio Francisco.
Conversa vai, poesia vem, alguém do grupo elogiou e agradeceu a acolhida e principalmente o tamanho da casa, o que culminou num convite para um 'hometour'. E lá fomos nós…
O meu olhar ansioso vasculhava cada cômodo à procura de cama, claro; até que uma parenta dela falou de um enorme salão no andar superior, onde havia armadores para mais de cem redes, utilizadas para acomodar os visitantes. Quase tive um troço. Imediatamente meu pensamento foi para o Bastião – a Pousada - risos.
Meio sem graça, continuei o desbravamento do enorme aposento, até dar de cara com o espaço das redes.
Armadores por todos os lados. Confesso, desci meio desorientada.
Armadores por todos os lados. Confesso, desci meio desorientada.
Entretanto, para o meu contentamento, quando voltei à copa, uma das secretárias me disse: “Coloquei a sua bagagem lá no quarto em que ficará acomodada”.
Mal tive voz para agradecer pela informação e pela gentil atitude da moça, tamanha a felicidade que me invadia.
Mais que depressa quis saber o local, o que me foi indicado prontamente. Gente, vocês nem imaginam. Havia sido reservada a suíte master para mim.
Senti vergonha dos meus pensamentos e juízos maus.
Mas como a verdade não merece castigo, que seja dita: eu me adequei a muitas coisas destas paragens em que vim morar, mas ainda trago arraigadas certas tradições e raízes de minha cultura – dormir em cama é uma delas. E raízes, vamos combinar, são bem firmes no chão. Pelo menos, as minhas são.
Um dia, quem sabe...
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