domingo, 2 de fevereiro de 2020

OS HOMENS DE SABEDORIA DE MOSSORÓ



                                        Foto de Manuelito Pereira

Por Francisco Obery Rodrigues

    Quero, inicialmente, esclarecer que a sabedoria a que me refiro nesta crônica não é a da cultura adquirida em universidades, ou resultante da leitura de livros de filósofos, historiadores ou grandes romancistas. Claro que essa leitura ajuda, mas não é condição sine qua non. A sabedoria de que trato é a da experiência de vida e a do bom senso na convivência humana, no trato com os seus concidadãos. É a dos homens que agem na vida com prudência, com temperança.
    Embora o título desta crônica seja Os Homens de Sabedoria de Mossoró, desejo esclarecer que muitos nomes citados não são mossoroenses, mas radicados na cidade.
    Plutarco foi um filósofo grego que viveu no primeiro século da nossa Era Cristã. Diz-se que seus sábios ensinamentos, sobretudo sobre a Moral, serviram de guia para muitos cidadãos que desejavam levar uma vida rigorosamente ética. Estes passaram a ser chamados Cidadãos de Plutarco.
      Já a Bíblia apresenta os Capítulos Provérbios e Ssbedoria, cuja autoria é atribuída ao Rei Salomão, filho de Davíd, capítulos ricos de ensinamentos para meditação e para uma boa conduta, tanto dos filhos em relação a seus pais, como destes em relação à sua família e às pessoas com quem convivem na sua comunidade.
   Em minha cidade, Mossoró, havia, no passado, pessoas de reputação ilibada, homens com muita experiência de vida, que eram exemplos de dignidade no comportamento profissional, moral e cívico. Antigamente, quando uma pessoa tinha um problema sério, para cuja solução necessitava de um aconselhamento, era ao Vigário, ou ao Juiz, ou a um desses cidadãos a quem recorria em busca de uma orientação. O Professor Raimundo Nonato da Silva em um dos seus quase quarenta livros, fala sobre o assunto. No meu entender, cidadãos de sabedoria eram aqueles que sempre estavam, fosse no seu local de trabalho ou no seu próprio lar, a serviço do próximo.    
     Quando eu falo em cidadãos “daquele tempo”, refiro-me às pessoas respeitadas no meio em que viviam, na sua coletividade Eram homens de exemplar conduta, qualquer que fosse a sua profissão, e de reconhecida probidade.
      Em Mossoró, entre os cidadãos de reconhecida “sabedoria”, pelo que li e ouvi dos mais velhos, no meu tempo, estavam homens como Jeremias da Rocha (1848-1881), fundador do segundo jornal do Nordeste – O Mossoroense; Doutor Jerônimo Rosado (1890-1930), farmacêutico, respeitado chefe da numerosa família Rosado e um grande estudioso dos problemas de Mossoró; Cel. Miguel Faustino do Monte, que considero o maior mossoroense nascido em Sobral, Ceará. Grande empresário e benfeitor da Igreja, do Ginásio Santa Luzia e da família - parentes e amigos que trouxe de Sobral e em Mossoró deu guarida; Dr. Francisco Pinheiro de Almeida Castro, médico humanitário, abolicionista e político. Governou o município de 1890 a 1922); Cel. Bento Praxedes Fernandes Pimenta (1848-1910), comerciante, jornalista e abolicionista; Dr. Eliseu Viana (1890-1960), educador, dramaturgo e musicista.
            E aqueles que conheci pessoalmente: Major Francisco Romão Filgueira, falecido em setembro de 1958, quando eu já tinha 34 anos, foi figura de destaque da campanha abolicionista. Outro que também conheci foi o senhor Tertuliano Ayres Dias, alto, corpulento, farta cabeleira branca com grossos bigodes, Venerável da Maçonaria. Sua fisionomia, por si só, já impunha respeito e confiança; Ezequiel Fernandes de Souza, um dos fundadores da grande empresa que foi Alfredo Fernandes & Cia., cidadão circunspecto, correto e de elevado conceito; Dr. Jerônimo Vingt-un Rosado, homem de cultura, agrônomo, antropólogo, paleontólogo, historiador, o maior impulsionador da cultura em Mossoró. Tive o privilégio de ser seu amigo. Limito-me a mencionar esses, mas outros nomes também houve, de igual padrão moral. Outros que merecem ter seus nomes nesta relação foram os srs.  Pedro Fernandes Ribeiro, um dos principais sócios da firma Alfredo Fernandes Indústria e Comércio, homem sério e de elevado conceito;  e João Almino de Souza, de incontestável integridade, com os quais tive a honra de dialogar, principalmente o primeiro. Foram cidadãos de bem, com muita experiência e sabedoria da vida.
           Conforme Platão, ela, a sabedoria, seria “o uso do saber em proveito do homem”. O “saber”, no caso, seria restrito aos sábios? Não sei. A experiência acumulada ao longo de uma vida virtuosa, de constante observação do comportamento humano, mesmo que limitado ao seu mundo, não seria uma forma de obtê-la? Não poderia referir-se também a uma pessoa sobre cujo conceito trato aqui?
            Assim, dentro dessa premissa, incluiria aqui, ainda, como tal, o mestre Francisco João de Castro. Não sei onde nasceu; sei que morava no bairro Bom Jardim, era marceneiro e devia ter apenas o curso primário. Era casado, tinha filhos que trabalhavam na mesma profissão e lhe eram obedientes. Amigo do meu pai, aparecia sempre em nossa casa envergando terno completo, talvez com vários anos de uso – paletó, gravata e chapéu de feltro - vindo da missa dominical, sobraçando uma Bíblia. Se lia a Bíblia é possível que conhecesse outros livros. Moreno, mais ou menos um metro e setenta, um pouco corcunda, bigode brando, Papai o admirava pela ponderação de suas palavras e tal admiração também me contagiou, mesmo sendo apenas um adolescente. Não seria o mestre Chico João também um homem de sabedoria, assim como outros que tive o privilégio de conhecer, como o também marceneiro e violinista Vicente Gomes Bezerra, outro amigo do meu pai e frequentador da nossa casa. E o músico erudito que foi Joaquim Ribeiro Freire, mestre da banda municipal em determinado período?  Seu filho Bruno era agrônomo e foi meu colega no Banco do Brasil. Suas filhas Maristela e Dalva Stela eram musicistas. Sei que Dalva, foi professora na Universidade Federal do Ceará. Possuo um livro seu, excelente, sobre a história da música em Mossoró.


Sem comentários:

Enviar um comentário